Culinária com história e afeto
O que comer em São Pedro da Serra que provoque emoções
Intimista, afetiva, familiar, autoral… Há sempre o que comer em São Pedro da Serra que represente mais do que apenas se alimentar. Siga lendo e você vai descobrir o porquê…
Algumas das maneiras encontradas pelos criativos chefs aqui da nossa mais-que-linda vilinha serrana para tentar explicar a mágica que acontece dentro de suas cozinhas parecem descasadas da visão que nós, meros apreciadores, temos dessa arte. Afeto? Intimidade? Quem tem isso por utensílios e ingredientes? Mas vem daí, de algo muito particular, só deles, o modo como esgrimam suas queridas facas, fazem dançar misturas em suas amadas panelas e acertam a temperatura de seus fogões até transmutar delicados e selecionados ingredientes nos pratos mais especiais de seus cardápios.
Nesta postagem, vamos falar de três desses chefs, com destaque para dois já bem conhecidos de todos nós – moradores, frequentadores e turistas. Então, coma uma banana para não ficar com fome e siga lendo…
MARIA MENDONÇA (do Segredo Cozinha Intimista)
Não erraria quem dissesse que a chef Maria Mendonça é, por si só, uma receita viva. E daquelas quase impossíveis de repetir. Veja só: Escolha uma niteroiense com todo cuidado e deixe marinar durante a infância e a juventude sob a influência de uma mãe mineira. Leve ao fogo alto por sete anos em convívio diário com os ingredientes, cheiros e sabores da Amazônia. Baixe o fogo e mexa devagar, acrescentando aos poucos generosas porções de experiências de vida e de culinária no Norte da Itália. Deixe descansar por três anos, primeiro em Arraial D’Ajuda e, depois em Trancoso, que é para pegar bem aquele gostinho tão particular do Sul da Bahia. Leve de volta à Amazônia e agite bem, deixando-a à frente da movimentada e exigente cozinha do hotel Caesar. Em seguida, dê um choque térmico, mergulhando o preparo em uma curta temporada na Suiça, e traga para São Pedro da Serra. Pronto.
Foi aqui, na mais-que-linda, que essa elaborada mistura veio realizar o sonho antigo de ter um espaço para praticar o conceito de cozinha ao vivo. No “Segredo Cozinha Intimista”, Maria Mendonça atende apenas clientes que fizeram reserva prévia e têm gosto por ver o seu prato nascer do zero, diante dos seus olhos, e ser servido pela própria chef. O menu, ela cria de acordo com os insights que têm quando acorda, sempre a partir de produtos orgânicos e da melhor qualidade. O tempero? Vem dessa vida toda de amor à culinária.
Quer saber o que é bom? Tudo. Desde o “simples” caldo de baroa com camarão e azeite trufado até o Nasi Goreng (um dos pratos mais famosos da Indonésia), passando pelo T-bone com batatas assadas e salada Segredo e o Lombo de bacalhau suculento com batatas ao murro, brócolis salteados, azeitonas e muito azeite.
NAEM FLORÊNCIO (do Cantina Florêncio)
Tem gente que não acredita, mas o mundo é redondo e, se você partir de um ponto e der a volta em linha “reta” vai acabar de volta ao lugar de partida. Foi o que provou Naem Florêncio. Minhoca da terra, como se diz aqui no interior, esse friburguense com quase 50 anos de cozinha, praticamente nasceu entre panelas e fogões. A mãe, Lourdes Florêncio, capitaneava o restaurante da família, a famosa Cantina Camping, no bairro da Cascatinha. E, enquanto os cinco irmãos brincavam fora de casa, nas cachoeiras, árvores e trilhas, ele ficou por perto, aprendendo com as artes de Dona Lourdes. Foi dela que Naem pegou um tal gosto pela magia dos temperos que, aos 15 anos, assumiu o restaurante da família – com a mãe ainda no comando da cozinha.
Mas Naem queria conhecer novas receitas, aprender novas técnicas, entender mais desta nobre arte. E, em 2007, teve a oportunidade de trabalhar em um hotel cinco estrelas em Barcelona, Espanha. Não pensou duas vezes – ou talvez tenha pensado. Mas foi. A ideia era ficar três anos. Passaram-se dez, com ele sempre envolvido em cursos de gastronomia catalã e espanhola. O coração, contudo, que batia mais forte quando estava entre as montanhas de Friburgo, foi se tomando de amores por São Pedro da Serra a cada visita, quando de férias no Brasil. Em 2018 se estabeleceu na vila. Primeiro, com o Tapas Florêncio, num espaço sobre a Pizzaria Raiz, quando tentou o público (local e turista) com delícias da comida espanhola. Depois, mudou de lugar e de nome. Primeiro o Bistrô Florêncio, para finalmente chegar ao Cantina Florêncio. E, depois de dar volta ao mundo – Brasil, Europa, Brasil – está de volta às origens familiares. Resgatou pratos tradicionais de Dona Lourdes, como o filé à parmegiana, a feijoada nobre, o nhoque de aipim, manteve os tapas da Catalunha e introduziu receitas próprias, autorais, como a Truta com purê de laranja e as empanadas gourmet.
ALEXANDRE SARAIVA (do Refazenda)
Caçula entre os restaurantes desta postagem, o recentíssimo Refazenda ocupa um lugar nobre da vila. Uma casinha com escadaria e pequena varanda, no Largo do Estrela, onde durante muitos anos a gastronomia de roça se confundiu com a do subúrbio do Rio e o samba de raiz. Quem arriscou o “Estação Glória”, dou os parabéns: tem boa memória. No comando dessa nova cozinha, há outro niteroiense, com passagens por Brasília, Curitiba, Portugal e Região dos Lagos. Trata-se do chef e, também artista plástico Alexandre Saraiva, que traz para as mesas dos clientes uma gastronomia afetiva, como ele próprio chama, por estar muito ligada ao que era servido nas refeições de sua família. São receitas simples, que ganharam temperos de diferentes regiões do país. O destaque vai para o tradicional prato de nhoque com carne assada ao molho ferrugem. Mas há quem prefira a carne louca desfiada com molho e polenta branca cremosa. Ou polpetone parmegiana servido com purê de inhame. Sem contar os fãs da galinhada (receita goiana com quiabo grelhado e aipim), e outras variações semanais, que lembram os almoços de fim de semana ao lado dos familiares.